ORAÇÃO DO OUTONO
Oliveira
Partilho o texto da oração e meditação do Cardeal José Tolentino de Mendonça, enviado hoje pelo Ir. Manuel Silva.
(A. Oliveira)
Ensina-nos, Senhor, a arte paciente do amadurecer, que pode ser dolorosa e bela ao mesmo tempo; e que ainda quando vivida em companhia não deixa de nos dar a exacta consciência da nossa incompletude e da nossa solidão.
Ensina-nos a não temer as transformações da travessia: as alterações que cada tempo determina dentro e fora de nós; a surpresa que, por vezes, nos sobrevém de olharmos o nosso rosto no espelho ou de reconhecermos a hesitação do nosso rastro no caminho.
Ensina-nos a aproveitar tudo, avizinhando sempre o nosso coração mais da gratidão que do desânimo e do rancor. A reaproveitar aquilo que ficou apenas esboçado; o que guardamos para depois e nos esquecemos; o que ficou combinado e não se cumpriu; o que por alguma razão consideramos inutilizável, mas do qual não nos desfizemos.
Ensina-nos, Senhor, a alegria que pode haver na celebração não apenas do muito, mas também do pouco; a acender os dias com aquilo que restou, mesmo se nos parece distante do que já foi; a congratular-se com aquilo que é possível; a comover-se com aquilo que os outros podem dar, ainda que não coincida com o havíamos pensado.
Ensina-nos que a fragilidade pode ser uma forma de fulgor como nos segredam as folhas que se desprendem. Elas não se precipitam contra o chão, mas baloiçam desenhando uma entrega; e, quando se entregam, descobrem que afinal se prolongam.
Ensina-nos a acarinhar os frutos, mesmo os que se escondem detrás de uma casca rugosa ou os que cresceram em nós, mas que nós não veremos e caberá a outros colher.
Cardeal José Tolentino de Mendonça
6.11.2023